o roqueiro e o mar

28 mar

Lula Côrtes no final de 2010. Foto: nataldorecife

A conversa durou a tarde inteira. Lula tinha acabado de sair do hospital e estava retomando as atividades normais. Passou por algumas complicações cardíacas durante uma apresentação e foi internado. “O meu peito apertou no meio do show! Os músicos começaram a tirar sarro. Eu desci do palco e fui até o bar. Tomei uma dose e não melhorou…. fiquei sentado em uma calçada do Recife Antigo até ser ajudado por uma menina”. Foi mais ou menos isso que ele disse. Coloquei as aspas por educação, já que o único registro daquela conversa ficou em minha memória.

Essa lembrança voltou com força depois da notícia de sua morte. Lula Côrtes se foi. O último suspiro do real período psicodélico que o Brasil viveu.

Morei em Recife entre 1997 e 2002. Dos 15 aos 21 anos. Vivi muita coisa ali… e sempre esbarrava com essa figura magra, bronzeada e com os cabelos brancos queimados pelo sol. Podia ser em algum show gratuito no Recife Antigo ou na praça de alimentação do Shopping Guararapes. Sabia, e não sabia, de sua importância para a música brasileira. Fui conhecer a história depois que mudei para Curitiba e entrei no mundo do vinil. Acompanhava os leilões virtuais do disco “Paêbirú” e me lamentava por não ter parado para conversar com ele. Sentar e tomar uma cerveja.

O gringos sempre deram mais valor a este disco gravado por Côrtes e Zé Ramalho em 1975. Clássico absoluto da psicodelia brasileira e misturas de ritmos. Quando eu lia as resenhas e comentários, só aumentava a angústia.

Lá por 2003 (ou 2004?) fui passar as férias em Recife e aproveitei para fazer algumas entrevistas. Lula Côrtes na cabeça… Marquei uma conversa inicial antes de partir para a entrevista. Ele queria mais informações e eu precisava sentir um pouco do terreno que iria encarar. O papo começou em uma creche que ele mantinha no bairro de Candeias.

Finalmente, consegui sentar e tomar uma cerveja com ele.

O pensamento bagunçado e a mistura de emoções eram explícitas. Ele falava sobre a felicidade em retomar a rotina com as crianças enquanto mostrava fortes desenhos produzidos no período hospitalar. Era um artista plástico de mão cheia. Traços marcantes que delineavam os companheiros de quarto. Pacientes em estado terminal, médicos, familiares e camas vazias.

Continuamos em um boteco ali próximo. Lula tirou um maço de Hollywood e pediu uma dose de uísque. Cowboy. Enquanto esperava a bebida, reclamava dos incômodos da recuperação física e arrancava os filtros de todos os cigarros. Fumou todos, com a mesma vontade de aproveitar a vida e contar sua história. “Ficam fazendo festa para o Chico Science até hoje. Gosto de seus discos e não tenho nada contra… mas eu fui o primeiro a misturar sons estrangeiros com ritmos nordestinos. Ninguém lembra disso… só falam que eu era um loucão que aparecia nas festas distribuindo baldes de ácidos. Porra! Se eu tivesse um balde de ácido naquela época, estaria muito rico hoje… ou morto”, e dava risadas.

A crítica é verdadeira. Mas o caminho seguido por Chico Science foi um pouco diferente. Outros tempos, outro público. A antena fincada no mangue servia, também, para reverberar os sons de Côrtes. Críticos deslumbrados esqueciam disso.

Resolvemos deixar a entrevista para o dia seguinte. Liguei para confirmar o horário e ele me diz, “velho! Foi mal. Esqueci da entrevista. Tô em um barco indo para Fernando de Noronha. Deixa para quando eu voltar. Em quinze dias a gente senta e conversa”.

Não rolou.

Fiquei puto na época. Mas carrego essa conversa até hoje…

Ele mudou. Se acalmou e concentrou os esforços na luta contra a doença. As últimas notícias que tive era sobre seu trabalho como assessor cultural da Prefeitura de Jaboatão dos Guararapes e na possível reedição de “Paêbirú” com ajuda internacional. Lula continuou no meio cultural, nos palcos, quadros, livros e crianças. Um artista completo que merece ser lembrado por toda sua obra.

Em meus devaneios, guardo a imagem dele livre, no meio do mar, cabelos ao vento e o celular na mão.

Um brinde, Lula. Boa viagem.

 

piloto

17 jan

para quem não viu…

de boa…

11 jan

Toda a imagem junkie vendida desde 2006 por tablóides, jornais, piadistas de plantão e paparazzis, caiu por terra. Pelo menos para mim. Testemunhei uma cantora completamente diferente no palco. Carinhosa, envergonhada, alegre e “concentrada”. Amy Winehouse merece o posto de diva moderna e mantém um domínio instintivo no jazz, soul e pop com o charme de quem busca um cano de escape nas raízes da música negra. Esqueça as histórias de drogas, escândalos e barracos. A música é seu grande barato e é isso que está explícito no palco.

Ela sempre seguiu muito bem a cartilha de grandes ícones do gênero. Um talento único com abusos de entorpecentes e vida pessoal conturbada. Não deve nada a Bessie Smith, Billie Holiday, Charlie Parker, Miles Davis, Etta James e companhia… em todos os sentidos. A única diferença é que hoje contamos com uma assustadora cobertura da mídia e a curiosidade mórbida que paira sobre o público. Se Billie Holiday estivesse viva, seria tratada do mesmo jeito.

A tensão momentos antes do show é inevitável. Será que ela vai aparecer mesmo? Em que estado? Vai conseguir cantar? E o clima de comentários sem graça no meio do público só aumenta a agonia. A impressão que dá é que as pessoas compram o ingresso esperando uma performance falida… assim podem falar mal, reclamar e sair dizendo que já sabiam que ia dar merda. Ou só conhecem “Rehab”e aguardam um show de horrores embalado pela soul music. Mal ae, gente. Não foi isso que aconteceu no último sábado, durante a primeira apresentação de Amy no país. Desde 2008 ela não encarava um show aberto, com a banda completa e pressão mundial. Foi bonito de ver.

Uma apresentação de jazz bem intimista, com pitadas de doo-wop e ska que serviam de cenário para histórias modernas… tudo isso escondido em um cavalo de tróia pop. Fato raro hoje em dia. Clima de praia, roupas brancas e soltas, o repertório do “Back to Black”, as versões de clássicos obscuros e novidades.

Sua voz está ótima, com postura centrada e um domínio até meio estabanado da situação. Deslizes perfeitos e suaves que evidenciam aspectos humanos ausentes nos sites de fofocas. Lembra bastante aquele espírito de “limpeza”que está na fase racional de Tim Maia, sacada que surgiu durante um café com a Juliana Sartori (bróder na Lumen FM) e é claro que não releva aspectos religiosos ou a total ausência de drogas e alcool.

Existe um espírito fraternal entre os músicos que beira a postura de irmãos mais velhos protetores. São pacientes, cuidadosos e têm jogo de cintura para qualquer atitude inesperada de Amy. Se comunicam com os olhos enquanto ela sai do palco sem avisar – que só aconteceu, de fato, duas vezes. Uma no início do show e a outra antes do bis. Foi um grande laboratório para testar seus novos limites. Nessas horas, quem segura a onda é Zalon, um dos backing vocals que interpreta algumas músicas durante os shows enquanto ela ficou ali, sentadinha… perdida em suas próprias viagens como na foto que abre o post. Bem de boa… curtindo um retorno acima do esperado.

Maravilha… 2011 começou muito bem e cheio de surpresas. Feliz Ano Novo.

ps. estou fazendo os uploads dos vídeos. daqui a pouco eu posto

novo disco do warpaint

19 out

“The Fool” é o primeiro disco do Warpaint e tem lançamento marcado para o próximo dia 25… mas já vazou. Enquanto isso a Rough Trade aproveitou para liberar a sua audição “formal”… com o reforço do Hype Machine. Que empenho…

um salve para a melancolia californiana…

Não esperava esse resultado… ja é um dos discos do ano.

Ouve ai. depois conversamos

 

senhoras e senhores… pavement

18 out

eles estão chegando…

NEP: Semana teeeeensa

18 out

O projeto Smirnoff Nightlife Exchange começa uma semana de momentos críticos. As ações correm soltas tanto pelo campo virtual, quanto físico. Informações, pistas de dança e drinks. A exposição Smirnoff @ Nightlife terminou nesse domingo em SP, com todo o banco de dados sobre a vida noturna na capital paulista desde os anos 70. Fotos, discos, objetos, drinks da época e uma pista de dança com os principais hits de cada década. De graça. Pelo visto a coisa foi boa

E esta é a última semana para você participar do intercâmbio das festas. Ainda dá tempo de deixar por lá suas dicas e sugestões do que merece ser exportado nas baladas brasileiras. Djs, bandas, casas, festas, roupas, drinks, comidas, luzes, interferências e por ai vai… Também pode participar do concurso que leva você e mais três amigos para uma das cidades envolvidas com o troca-troca. Só para lembrar: Estados Unidos, Inglaterra, Argentina, Austrália, Canadá, Alemanha, India, Irlanda, Líbano, Polônia, Africa do Sul, Tailândia e Venezuela estão entre os possíveis destinos. Entra na página do projeto lá no facebook, responde a pergunta e torce. Dia 22 de outubro eles fecham o container e no dia 23 sai o resultado do concurso junto com o nome do país-brother-de-festa do Brasil… é ou não é uma semana tensa? Corre.

vai uma festa libanesa, ai?

ou polonesa…

e já notou como estamos bem servidos por aqui?

é…

Sempre é bom lembrar como é que funciona o projeto Smirnoff Nightlife Exchange… aqui, aqui ou:

ska eslovaco

14 out

então a brincadeira continua…

Direto de Bratislava… a 3rd wave segundo o grupo Ska2tonics

pop polonês

14 out

a “namoradinha da polônia”…

Monika Brodka tem 23 anos e foi descoberta em 2004, durante uma edição do programa “Pop Idol”. Cantou “garota de ipanema” em português e já lançou três discos. “Granda” é o mais recente e bem esperto. Álbum arejado, curtinho, atual e fácil, fácil… não me empolgava com um disco nessa linha desde o “alright, still” da Lily Allen (queridona).

O single de “w piecu smakach” é uma das músicas mais escutadas na internet hoje…

2005 feelings?

7 out

Achei bem honesto esse single novo do The Wombats. Lembro que não fui muito com a cara do disco anterior deles, mas “Tokyo (Vampyres & Wolves)” carrega uma nostalgia tanto no refrão quanto na pegada. Saudades de 2005…

A cidade de Tokyo merecia essa homenagem. Os dois primeiros trabalhos da banda só foram lançados no Japão…

O disco novo deles sai ano que vem…

contra

7 out

jack kerouac morreu conservador e sem assumir os hippies como “filhos”. robert crumb se perdeu um pouco… esqueceu a liberdade em sua obra (mas suas produções estão ai). laerte está em processo de reinvenção… e somos suas testemunhas.

bem ou mal… é isso.

testa diariamente os limites literários, plásticos, temporais e espaciais de sua obra. Dentro e fora dos quadrinhos… uma vez eu ouvi a teoria de que michael jackson representava uma nova espécie de vanguarda… o primeiro artista que mudou a cor do corpo. Seguindo essa linha de raciocínio (e todo o processo experimentado por laerte), podemos deduzir que…

…ele sabe o que está fazendo… você é que não entendeu.

e ainda vai mais longe:

Reclamavam de um hermetismo excessivo, de uma obscuridade que atrapalharia a fruição do público. Evidente que não concordo. Rejeito, inclusive, o adjetivo nonsense para definir o meu trabalho. Nonsense pressupõe o caos, a ausência total de significado. Ocorre que minhas tiras buscam, sim, um sentido – mesmo que seja o de aplicar um golpe na lógica, o de implodir o senso comum. Discussões semânticas à parte, noto que a trilha inaugurada em 2004 vai se fechando. Preciso, no fundo, me reconectar com o adolescente atrevido que, 45 anos atrás, ingressou num curso livre de desenho e pintura doido para se expressar. Preciso reencontrar a chave daquela inquietação, daquele frescor, daquela ousadia

Quem estiver Curitiba hoje pode até bater um papo com ele lá na Itiban Comics. Lançamento de “Muchacha”, 19h.